Cooperação e especialização no Judiciário

Vivemos tempos de forte protagonismo  do Poder Judiciário, a ponto de infundir verdadeiras paixões “futebolísticas”, e simetricamente, avaliações simplistas da realidade. Não é incomum surgirem soluções simples para problemas complexos. E, logicamente, erradas! Bem sabem os operadores do direito as imensas tarefas e desafios que recaem àqueles encarregados de fazer justiça no Brasil.Pode causar espanto, portanto, um artigo que se proponha a valorizar os avanços do Poder Judiciário e clamar por uma advocacia diferente. Nestas breves linhas defenderemos a valorização da autonomia privada e da advocacia colaborativa na prevenção e resolução de disputas, enfatizando alguns fenômenos que apresentam impacto crescente na vida dos brasileiros:advocacia colaborativa, desjudicialização e especialização judiciária.Neste sentido, cabe transcrever o disposto nos parágrafos 2º e 3º do artigo 3ºdo novo Código de Processo Civil (CPC): “O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”Importante destacar que a desjudicialização guarda estreita relação com os princípios da cooperação, da boa-fé e da autonomia da vontade, e está em plena consonância com inovações decorrentes do novo marco legal brasileiro, que em 2015 produziu: a Leide Mediação, a reforma da Lei da Arbitragem e o novo Código de Processo Civil. Sob este novo e promissor prisma legal, procedimentos complexos e usualmente longos – inventário, usucapião e divórcio – podem ser realizados com celeridade e praticidade nos cartórios extrajudiciais, desde que haja presença de advogados para ratificá-los, tornando-os assim aptos a gerar efeitos legais.Esta nova via jurisdicional implica um deslocamento de determinadas atividades ou procedimentos da esfera judicial, com vistas a melhorar a efetividade processual e a própria eficácia do direito. Trata-se de conferir maior liberdade às partes para que solucionem seus conflitos fora do Poder Judiciário ou que transfiram para terceiros atividades de atribuição típica dos juízes. Eis, em apertada síntese, o que se entende por desjudicialização. Este fenômeno, tão inevitável quanto promissor, tem como condições precedentes o consenso entre as partes que, devidamente assistidas por profissionais com mentalidade negocial e não adversarial, devem estar conscientes das vantagens e riscos ao abrirem mão, total ou parcialmente, da tutela judicial na salvaguarda de seus interesses.

Cabe-nos agora indagar se os empresários que atuam no Brasil também podem tirar partido deste novo arcabouço jurídico. Depende. Essa resposta ilustra bem um dos principais obstáculos para a adoção dos métodos extrajudiciais e/ou autocompositivos: a busca pela certeza, o sonho da sentença favorável e a relutância em reconhecer parcela da responsabilidade sobre o conflito instaurado.Quanto mais os agentes econômicos conseguirem assumir o protagonismo na gestão de disputas mais chances haverá para o florescimento da cultura de ADR (Alternative Dispute Resolution). Uma dessas formas é a mediação extrajudicial, mecanismo privado de solução de controvérsias, onde um terceiro imparcial utiliza técnicas para auxiliar, estimular e identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia e por fim à disputa.Por sua natureza autocompositiva e voluntária, a mediação privada costuma apresentar resultados expressivos, em especial quando as partes e advogados colaboram. Ainda que exitosa, não é milagrosa e por vezes requer uma etapa seguinte, em sede judicial ou arbitral, para encerrar o conflito.Nesta busca pela definitividade, o novo CPC traz uma novidade alvissareira:confere maior amplitude para o já conhecido negócio jurídico processual. Em sua nova versão, permite que as partes previnam riscos, dividam responsabilidades, regulem questões, flexibilizem o procedimento e alterem aforma dos atos processuais. Por exemplo, a própria mediação extrajudicial pode ser objeto desta convenção processual, nos termos do enunciado 29 da 1ª Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Conflitos.Por fim, merecem aplausos os recentes progressos na especialização judiciária, que consiste na alocação de experts para as complexas demandas judiciais, objetivando uma maior rapidez nos julgamentos, melhor qualidade técnica das decisões e maior previsibilidade para os agentes econômicos.Desde 5 de dezembro de 2017, a cidade de São Paulo passou a ser a única jurisdição no Brasil com especialização vertical da Justiça Empresarial,incluindo primeira e segunda instâncias. Exemplo a ser seguido por todo o Brasil.

Fonte: Valor Econômico – Por Armando Luiz Rovai e Amedeo Papa

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